97 – O Luto

O LUTO

A morte aparece na Bíblia como consequência da falta de Adão. Ele se tornou mortal. Desse modo deve ser entendido o versículo: "Pois no dia em que comeres (o fruto proibido), tu te tornarás mortal" (Gn 3). Somos sempre, segundo a Torah, mortais que recebem a graça divina a cada respiração, e a vida é um milagre permanente. Esse é o clamor de gratidão que o fiel ao abrir os olhos cada manhã exclama: "Obrigado pela alma que Tu me restituíste, grande é a Tua compaixão". Essa vida que é tão preciosa, que todos os mandamentos podem ser transgredidos, se for preciso salvar uma vida somente. Pois está escrito no Talmud: "Quem salva uma vida, salva o mundo inteiro". Nada deve ser feito para acelerar o final de uma vida. Pelo contrário, quando o último suspiro ocorrer, tudo deve ser feito para que o cadáver retorne logo à terra (o judaísmo proíbe a cremação); quanto ao sopro divino, ele retorna a sua fonte.

Na prática os ritos de luto têm, sobretudo, a finalidade de ajudar os mais próximos a viver o seu luto através de vários períodos. Na agonia, se reza uma oração de confissão que trata sobre a unidade de Deus e da sua providência. Depois o rasgão, que se refere aos sete parentes mais próximos (pai, mãe, irmão, irmã, filho, filha, esposo-esposa): trata-se de rasgar um pedaço pequeno da sua roupa perto do coração, para marcar a separação. É sempre um momento de amargura, talvez algo de agressivo inerente ao luto. Antes do enterro leem-se alguns Salmos onde se lembra do Criador, Juiz da Verdade, do qual aceitamos os decretos. Velas lembram a alma que é eterna.

Depois do enterro, os enlutados rezam o Kadish. Essa oração, escrita em aramaico[1] não é uma oração para os mortos, mas de santificação do Nome divino. Ela traduz o reconhecimento para com Deus pela "felicidade e pela infelicidade" e sua esperança no acontecimento messiânico. Essa oração é feita durante todo o ano de luto. Esse ano de luto se subdivide em três partes. Na primeira semana os enlutados não trabalham, ficam em casa e orações são organizadas na casa do falecido. Depois no mês seguinte, um ofício é marcado no trigésimo dia. E por fim a cerimônia no final do ano de luto. Nos anos seguintes uma oração de lembrança é organizada na sinagoga ou na casa do falecido para honrar a sua memória.

Não podemos terminar sem falar da importância do papel fundamental da comunidade, que longe de ser uma estrutura anônima sempre poderá ajudar, nas alegrias e nas adversidades, as pessoas que  se encontram em dificuldades.


[1] Língua falada pela maioria dos judeus após o exilo da Babilônia. Essa oração inspirou o Pai Nosso da Igreja.